Andrades pelo Mundo

Veja como é viajar pelo mundo em um carro com a família Andrade

Participe desse projeto

Veja como patrocinar e participar dessa aventura

Causos da Estrada

Busca no Site

Chegamos na Itália vindo da Grécia, num ferry grego muito velho e desconfortável (pensa numa noite longa!). Nossa intenção era ficar pelo menos duas semanas na Grécia, mas já estávamos quase em dezembro e a chegada do inverno e da chuva fez com que desistíssemos e fôssemos mais cedo para a Itália. Queríamos visitar algumas ilhas gregas, mas com frio e chuva seria uma perda de dinheiro e tempo.

Somado a isso, tivemos alguns episódios desagradáveis na Grécia que nos desgostaram um pouco. Quando chegamos num país novo, gostamos muito de passear no mercado, para ver o que existe de diferente na alimentação daquele lugar. E na Grécia não foi diferente. O problema é que entramos no mercado geralmente comportados e depois cada um vai para um lado, o Dani corre pelos corredores, eu chamo o Cris de um outro corredor (geralmente gritando de leve) para ele ver o que eu encontrei e vice-versa. Tentamos agir de forma discreta, eu garanto. Não é nada escandaloso ou extremamente barulhento, mas não passamos desapercebidos, com certeza.

Me pareceu que a Grécia sofre com a quantidade de imigrantes ilegais e refugiados que estão no país e provavelmente pequenos furtos no mercado sejam muito comuns por lá. Além disso, os gregos nos passaram a impressão de ter muito preconceito com estrangeiros. Não qualquer estrangeiro, não me entendam mal, mas aqueles que frequentam os lugares dos locais, os mercados dos locais e, portanto, que não são turistas (fomos muito bem tratados em Atenas, por exemplo, que é uma cidade extremamente turística).

Sempre que chegamos numa cidade nova questionamos algum local sobre a questão da segurança e em um dos campings que ficamos a dona nos disse que aquela cidade já tinha sido muito segura, mas hoje com a quantidade de refugiados não era mais.  Acredito que exista certa verdade no que ela disse, o que nos surpreendeu foi o desprezo e repulsa com que ela se referia a essas pessoas, como se todos fossem bandidos. E foi assim que nos sentimos nos mercados fora das áreas turísticas, como bandidos.

Num mercado, inclusive, o segurança ficou nos seguindo o tempo todo que estivemos lá dentro. Num determinado momento, eu fiz uma pergunta aleatória para ele, para mostrar que já tinha percebido que ele nos seguia, mas de nada adiantou, ele continuou no nosso encalço. Fomos para o caixa pagar e o segurança foi até o caixa que estávamos e falou alguma coisa em grego com a atendente e ficou do lado de fora aguardando. Me senti tão humilhada aquele dia, minha vontade era tirar satisfação, perguntar porque ele chegou à conclusão de que iríamos furtar alguma coisa e dizer o quanto a sua conduta era desrespeitosa. Nunca em minha vida tinha sido tratada como uma ladrazinha de mercado! E olha que nem estávamos malvestidos!

Mas como o Cris diz que eu sou muito encrenqueira (e eu sou mesmo rs), resolvi deixar para lá, mas não engoli isso o dia inteiro. Fiquei repensando o ocorrido várias vezes e sentindo a indignação de ter sido tratada tão mal sem nenhum fundamento. Eu me compadeci profundamente das pessoas que são obrigadas a sair dos seus países em conflito (quanto sofrimento já não passaram) e são recebidas desse jeito na Grécia (e em tantos outros países). Eu passei por isso um dia, peguei minhas coisas e segui viagem. Eles não têm para onde ir e precisam aguentar esse desprezo e preconceito, que muitas vezes é infundado.

Bom, chegamos na Itália e qual foi a primeira coisa que fizemos? Ir ao mercado! Claro que depois do ocorrido na Grécia, fizemos mil recomendações para o Dani se comportar, não correr pelo mercado, e combinamos de não ficar se chamando de corredores diferentes. Que nada, ao entrar no mercado nem fomos mais notados, a bagunça e barulho dentro do mercado eram garantidos pelos próprios italianos. Eles realmente são barulhentos rs. Amei, estava em casa! Baixamos a guarda e fomos nós mesmos, com a certeza de que isso não causaria nenhuma estranheza nos locais, como não causou mesmo!

Ficamos quase um mês na Itália e conseguimos sentir um pouquinho do clima do país e mudar algumas opiniões preconcebidas. A verdade é que esperávamos de alguma forma que seríamos maltratados, pois sempre ouvimos muitas pessoas falarem como o italiano é grosseiro no trato com as pessoas. Não aconteceu conosco, felizmente, pelo menos não como imaginamos que seria. Ficamos surpresos que eles não respeitam faixa de pedestre, dá para acreditar nisso? Foi a única vez que um italiano nos tratou rispidamente, porque ele teve que nos esperar atravessar a rua. Ele gesticulou e falou qualquer coisa de dentro do carro, eu apontei a faixa e gesticulei da rua e ele saiu esbravejando rsrs. Depois dessa, não arriscamos mais, sempre esperávamos não ter nenhum carro para atravessar a rua (eles não param mesmo!).

A verdade é que não puxávamos muito assunto, não fomos para a Itália achando que faríamos amigos. Se entrávamos em algum estabelecimento, falávamos o estritamente necessário e sempre éramos tratados com muito respeito. Interessante que é de onde menos se espera que muitas vezes vem.

Quando batemos o carro, estávamos hospedados num Airbnb na região da Toscana. Onde aconteceu o acidente não tinha Uber, não passava táxi e não tinha ônibus mais aquele dia para a cidade que estávamos. Pedimos ajuda para o dono do Airbnb, um senhor de uns 70 anos de idade, muito bonzinho, que viajou mais de 2 horas para nos buscar e mais 1 hora para nos deixar em casa. Quando dissemos que gostaríamos pelo menos de pagar pelo combustível, ele se recusou a receber, nos dizendo que já tínhamos passado por muita coisa aquele dia. Eu tive vontade de chorar na hora, mas apenas o abracei e agradeci muito. A verdade é que existe pessoa boa, pessoa má, gente mala e gente bacana em qualquer nacionalidade.

Ainda na Itália eu precisei pedir carona, porque o Cris foi para a cidade no ônibus da manhã alugar um carro para me deixar no aeroporto, logo depois que batemos o carro, mas o cartão estava no meu nome e eu tinha que estar lá. O próximo ônibus só saía no meio da tarde e meu voo sairia de outra cidade, a 5 horas de distância, na manhã seguinte. Não dava para esperar o ônibus da tarde. Fui descendo o caminho com o Dani, fazendo sinal de carona para todo carro que passava. Um senhor que não falava nada de inglês nos deu carona e nos deixou na cidade mais próxima, já no ponto de ônibus de onde saía ônibus a cada 30 minutos para a cidade que eu precisava ir.

Quando precisamos realmente de ajuda, Deus sempre abre uma porta, e encontramos bondade ainda nas pessoas, seja onde for. Nunca me esquecerei do seu Genaro, o dono do apartamento do Airbnb, e do que fez por nós naquele momento de tanta angústia. Alguns dias antes ele tinha passado na casa para ver se tudo estava bem e nós o convidamos para um café, ficamos batendo papo por algumas horas, ele nos falou um pouco da sua família, nós falamos da nossa e foi muito gostoso. Mal imaginávamos que alguns dias depois íamos precisar tanto da sua ajuda.

Passamos por alguns lugares muito bonitos e surpreendentes na Itália. Nossa primeira surpresa foi a cidade de Matera, na costa leste do país, perto do calcanhar da bota. Descobrimos sobre essa cidade por acaso, conversando com a dona do camping onde estávamos só de passagem. Depois seguimos para a Costa Amalfitana, e ela é tudo isso que falam e mais um pouquinho. Num dos dias, paramos em um dos mirantes da estrada, já próximo ao pôr do sol, abrimos o fundo do carro, fizemos um piquenique ali, com aquela paisagem incrível, ouvindo uma seleção aleatória de músicas e tendo como companhia um casal suíço que não ia embora de jeito nenhum rs. No final do nosso piquenique, eles vieram conversar com a gente e descobrimos porque eles não tinham ido embora ainda: Estavam curtindo as nossas músicas! Um casal muito simpático, aliás. Conversamos bastante com eles.

Seguimos para Roma e descobrimos que a cidade demandava muito cuidado, muito mesmo! É tanto golpe contra turista que você não se atreve a dar atenção para ninguém na rua. Aliás, não é só lá, mas em todas as cidades grandes da Itália. Conhecemos algumas brasileiras em Milão que tinham acabado de ser furtadas na estação de trem, levaram seus passaportes, cartões, dinheiro e celular. Felizmente não nos aconteceu nada, nem em Roma nem em Milão, mas compramos um ingresso para umas ruínas em Roma e no fim não conseguimos ir. Eu fui até a fila para essa atração e ofereci o ingresso para algumas pessoas, de graça, só para não jogar fora, mas ninguém quis nem falar comigo, tudo o que eu ouvi foi: I don’t speak English. Claramente medo de ser vítima de algum golpe. Eu acabei jogando fora os ingressos, uma pena.

Além dos lugares que visitamos e dos muitos que nos surpreenderam, a famosa siesta também foi motivo de muita surpresa, e frustração. Nós já tínhamos ouvido falar dela e de como os italianos tiram um tempo no meio do expediente para a famosa soneca da tarde. O que não sabíamos é que essa pausa é enorme, de várias horas. Muitos estabelecimentos fechavam por volta das 13hs e só voltavam às 16hs ou mais. Visitamos a Itália já próximo ao inverno e os dias eram bem curtos. Amanhecia por volta das 8hs e 16hs o sol já estava se pondo. Por causa do frio, só conseguíamos sair da barraca umas 9hs e geralmente começávamos a passear às 11hs, duas horas depois as cidades pareciam cidades fantasmas, completamente abandonadas. Fecha quase tudo, mercados, postos de gasolina, todo tipo de lojas. Apenas uma ou outra lanchonete permanece aberta (porque provavelmente não pertence a um italiano). É frustrante. Quando eles voltam a abrir, o sol já está se pondo e o passeio fica inviável no frio. No verão, quando os dias são mais longos, essa siesta provavelmente não é um problema, turisticamente falando, mas no inverno limita bastante. Nas grandes cidades, como Roma e Milão, esse costume não existe, mas sentimos muito nas cidades menores, como as cidades da Toscana e da Costa Amalfitana.

Outra coisa que decepcionou um pouco foi a pizza. No nosso estilo de viagem não conseguimos comer em restaurantes, porque isso onera muito o nosso orçamento. Então não sabemos de fato como é ter uma pizza italiana sendo feita na hora para nós. O que vivenciamos foi a realidade das lojinhas que vendem pedaços de pizza por todo lado na Itália. Nessas lojinhas, nunca pegamos uma pizza gostosa, com cara de que tenha sido feita a pouco tempo. Todas eram borrachudas, duras, frias e davam azia depois. Em alguns lugares a massa parecia um pão e quase nada de queijo, e em outros lugares parecia uma bolacha fina. Uma verdadeira decepção! A pizza italiana que conhecemos não agradou, mil vezes a pizza brasileira! O Cris acha que tem a ver com a época que fomos, como tinha poucos turistas, a saída era menor e a pizza nunca estava fresca. Pode ser!

Achamos a Itália um país muito caro. Depois da Noruega, foi o lugar que pagamos mais caro em combustível e alguns campings tinham coragem de cobrar mais de 40 euros por dia, um absurdo para dormir numa barraca e dividir banheiro com um monte de gente, e na baixa temporada. Fico imaginando quanto eles cobram na alta temporada.

Um pedaço de pizza, que não é tão grande assim, pode custar 5 euros, convertendo, 20 reais. Muito dinheiro para uma pizza ruim, fria e dura. E olha que essa é uma das comidas mais baratas que vimos por lá.

Não podemos esquecer os pedágios, que são insanos. Tentávamos viajar o máximo pelas estradas não pedagiadas, mas nem sempre era uma tarefa fácil e uma viagem de poucas horas facilmente se transformava numa viagem de dia inteiro pelas não pedagiadas. Nunca sabíamos se compensava o gasto maior com combustível e o desgaste de muito mais horas na estrada.

Apesar das coisas que não apreciamos muito na Itália, a verdade é que o saldo é muito mais positivo do que negativo e nós com certeza gostaríamos de poder visitar esse país novamente, em especial a Toscana, que acabamos não aproveitando muito por conta da batida do carro. Fico imaginando como essa região deve ser surpreendentemente linda na primavera e no verão, com seus pores do sol vermelhos alaranjados sobre aquela linda paisagem de campo.  Quem sabe um dia?

Natany Gomes

Submit to FacebookSubmit to Twitter